Nós, brasileiros, e o jeitão dos portugueses.
Como todo ser humano, não há regras gerais que definam tipos de comportamento e com os portugueses não seria diferente. Procuro trazer o que mais observo para ajudá-lo em sua integração, mas não estamos falando de um bloco onde todos se comportam da mesma forma, obviamente. Apesar de receber relatos de resistência a brasileiros, não tive qualquer contratempo desta ordem. No máximo, uma ou outra cara mais fechada de algum atendente de loja- e eu nunca saberei se a pessoa estava num mau dia, se aquele era seu jeito habitual ou se tinha algo a ver com o fato de seu ser brasileira. Desencane. Todos têm os seus dias em que gostariam de não ter saído da cama.
Algumas coisas interessantes que parecem ser peculiaridades pude observar desde que cheguei a Portugal. A maneira dos portugueses interagirem entre si e com quem é de fora é uma delas. Os portugueses costumam ser bem objetivos, algumas vezes quase secos em suas observações. Eles parecem gostar de conversar como quem está discordando e o fazem naturalmente. Um diz uma coisa, o outro contradiz e eles podem seguir por muito tempo neste exercício, não para brigar, mas porque este pode ser um jeito deles naturalmente conversarem.
Outra coisa interessante: eles não “fazem sala”, como dizia a minha avó. Eles não ficam de conversinha apenas para lhe agradar. Isso às vezes chama a atenção de quem estava habituado a ter no Brasil “conversas de elevador”. Um exemplo? “Que saco, hoje parece que vai chover”, você talvez dissesse no Brasil. E lá, alguém poderia responder: “ Sério? Não sabia, não li no jornal nem vi nada na TV”… Aqui, talvez alguém responda: “Não, não vai chover”. E seguisse discorrendo sobre o porquê não vai. Ou porque a chuva é importante. E sobre o quanto os incêndios anuais na Península Ibérica são causados pela seca do verão e o quanto a chuva pode ser uma bênção. E aí você pode pensar: por que fui abrir a minha boca?
Pequenas coisas, aparentes bobagens, mas que ilustram como sua habilidade de socialização terá que assimilar novas informações, ferramentas e habilidades.
Apesar de alguns mau humorados, como há em todo lugar, para boa parte dos portugueses é um prazer falar com um brasileiro. E nunca ouvi nada do gênero carnaval-café-Pelé. Eles sabem bem mais do nosso país do que costumamos saber sobre o deles antes de pretendermos imigrar, leem sobre a nossa política e nossos problemas, assistem às novelas da Globo e amam música brasileira. Costumam elogiar nossas praias, nossa alegria e nossa disposição. Possuem uma boa ideia do momento pelo qual passa o nosso país e costumam ser solidários neste sentido.
Referem-se aos brasileiros que imigram distinguindo-nos muito claramente no quesito confiabilidade, caráter, profissionalismo. Tiveram suas dificuldades com imigrantes no passado e podem parecer meio desconfiados, mas em pouco tempo você consegue demonstrar a que grupo de brasileiros pertence e será acolhido segundo aquilo que plantou.
Na minha primeira semana aqui, meu marido e eu tivemos este diálogo com uma caixa de supermercado, que puxou assunto conosco, curiosa:
Brasileiros?
Sim.
A passear ou para morar?
Para morar.
Tenho assistido que vosso país passa por grandes dificuldades. A cá podemos ser pobres, mas a verdadeira riqueza é poder andar nas ruas com tranquilidade.
Ouvir aquilo causou um misto de sentimentos: gratidão, por estarmos num lugar que nos faculte esta riqueza, mas uma profunda tristeza pelo Brasil. Mais adiante, em outro artigo, falarei mais sobre isto…
Uma das coisas que mais gosto aqui? A capacidade que a maioria deles têm de cumprir o que combinaram e o quanto isso é natural por aqui. Há uma seriedade em geral, sua palavra vale e vale muito. Se você se comprometer, eles vão sinceramente acreditar que você irá cumprir. Se você disser que gostou de um imóvel, não diga que vai ficar com ele apenas para que novos interessados não tenham chance (enquanto você segue procurando por algo melhor). Eles encerrarão as demais visitas e passarão a considerar que o imóvel é seu, mesmo sem ter nada assinado. E assim por diante. Por outro lado, se você comprar algo e não gostar ou mudar de ideia, guarde a nota e poderá devolver. A maioria dos lugares devolverá o dinheiro pra você.
Apesar de alguns brasileiros terem tido alguns comportamentos deploráveis no passado e mesmo em tempos atuais ( o que lamentavelmente nos deu uma fama um tanto quanto duvidosa), os portugueses parecem estar abertos a descobrir a que time você pertence: ao time de quem honra compromissos e palavra dada, ou ao time de quem não se pode confiar. Bom pra você e para nós se você fizer parte do primeiro time. Se não fizer, por favor, mude seus conceitos ou volte pro Brasil. Não precisamos trazer pro país que nos acolhe o que o nosso, lamentavelmente, tem de pior.
Gostou do artigo? Compartilhe em suas redes sociais.