Deep Fakes: quando o produto em questão é sua saúde mental


As fake news têm como objetivo manipular a opinião pública e visam obter uma resposta emocional das pessoas a quem se destinam. Apelam para coisas que são caras às pessoas, sobretudo seu senso moral e valores éticos. Uma vez atingido seu objetivo, costumam causar indignação, raiva, desconfiança, ansiedade e mesmo sintomas depressivos, pois causam distorção da percepção da realidade. 

Nas Deepfakes (combinação de palavras em inglês: deep learning, aprendizagem profunda, e fake, falsa), os manipuladores da informação vão além: fazem alterações em vídeos e áudios tão bem feitas, que, a olho nu, é muitas vezes impossível reparar que se trata de uma mentira.  Nos vídeos que usam este tipo de tecnologia pessoas dizem coisas que nunca disseram ou fazem coisas que nunca fariam. A edição é tão perfeita que o espectador não percebe que um determinado rosto foi sobreposto por um computador ou que palavras de um antigo discurso foram cortadas e reinseridas, produzindo uma fala totalmente diferente da original.

Graças a este tipo de  inteligência artificial, além da edição de áudios e vídeos, telefonemas podem ser simulados e confundem até mesmo o mais cético dos ouvintes. As Deepfakes reforçam o sentimento nas pessoas de que o que elas estão vendo não deixa margem a dúvidas, pois costumam ser vídeos ou áudios de pessoas reais, mais notadamente pessoas famosas e autoridades em determinado tema. Assistir a um vídeo ou escutar uma fala causa ainda mais impacto do que ver uma foto, que hoje as pessoas já compreendem que pode ser modificada artificialmente. Imagine você assistindo um telejornal como o Jornal Nacional, do Brasil, onde o apresentador (um famoso jornalista) dá a notícia de algo catastrófico. Um vídeo deste respeitado telejornal impacta muito mais do que um texto, uma reportagem ou uma foto. Imagine o apresentador informando algo totalmente falacioso, mas com todo o layout e a produção do jornal a referendar a informação. Ele falando um texto que nunca disse tendo ao fundo o cenário do JN, música de abertura, bancadas e sua colega ao lado. Difícil, não?

Se a exposição contínua à quantidade enorme de notícias e publicações nos mais variados meios leva o nosso sistema de alerta e medo a estar constantemente ativado, o dano psicológico é ainda maior com fake news. Não é por acaso que várias organizações na área da saúde mental recomendaram, ao invés de um bombardeamento quase constante, que as pessoas possam escolher dois momentos por dia para receber atualizações de notícias e optar por um ou dois canais de informação confiáveis para se informarem. E não, o Zap da família ou dos amigos não é informação confiável. Tampouco blogs, canais do YouTube ou sites com viés claramente político. Faça como seus ancestrais e busque informações nas grandes empresas jornalísticas, tanto de seu país quanto no exterior.

Busque sites oficiais, governamentais e tente ficar neles. Se a notícia for verdade, acredite: várias fontes sérias noticiarão. Se só aquele blog que você adora ou apenas sua bolha política está divulgando, as chances de serem fake news são grandes. 

Na retaguarda das fake news há toda uma mecânica psicológica e tecnológica que age em conjunto para torná-las virais. Por outro lado, reconhecer que recebeu fake news como informação e foi enganado pode suscitar sentimentos de raiva e frustração, especialmente se o leitor se sentir impotente perante as circunstâncias suscitadas pelo tema. Pode levar ainda à negação, se a pessoa for movida apenas pelo viés de confirmação- ou seja, se ela seguir acreditando naquilo que escolhe acreditar.

Nossa saúde mental pode ser muito afetada ao sermos bombardeados o tempo todo. O grande estrago das fake news, que as deepfake tornam ainda mais devastador, é que boa parte das pessoas passou a duvidar de TUDO. Tem gente questionando o holocausto, a ida do homem à Lua, o fato da Terra ser redonda… O que antes nos fazia rir pelo absurdo, hoje deixa a muitos aflitos e angustiados, pois não sabem mais o que é verdade. 

A onda de celulares e internet ajudou a afastar nossa geração do estudo da história do Brasil e do mundo. A desconexão com a realidade pode ser facilitada pela falta de leitura e pela falta de entendimento crítico (e à luz da história) do que está acontecendo. A historia costuma se repetir, mesmo que de formas diferentes. Se tivermos um bom entendimento de como estes fenômenos de manipulação de massas já ocorreram no passado, estaremos mais protegidos. Entender como foi a campanha maciça de manipulação da informação, desinformação e mentiras no nazismo, por exemplo, nos dá uma boa compreensão do que está sendo reeditado nos nossos dias. 

Vivemos em uma época em que está difícil separar realidade de ficção. Onde a mentira e a verdade parecem estar no mesmo patamar, disputando as narrativas. A mentira pode ser mais fácil de ser verificada, mas quando a verdade tem “camadas” e muda conforme o interlocutor que a divulga tudo fica mais difícil.  A chamada pós verdade nada mais é do que isto: alguém pegar uma pequena base de verdade e acrescentar camadas e camadas a tal ponto que a verdade deixa de existir e só sobra a narrativa fantasiosa, catastrófica ou persecutória. 

Uma questão que se impõe é: por quanto tempo as pessoas que produzem e distribuem fake news e deepfakes seguirão empoderadas pelas pessoas que são movidas apenas pelo viés de confirmação? Este viés, que considera verdade apenas o que confirma suas teorias, é o mesmo viés que reforça a indústria das fake news e é muito bem explorado por ela. Até onde- e até quando- as pessoas irão para verem suas crenças confirmadas e seus ídolos no poder? Seria esta suposta luta do bem contra o mal um vale tudo, um propósito de vida? 

Enquanto as pessoas não entenderem suas reais motivações, o trabalho de informação de qualidade e de desfazimento das mentiras (seja lá o nome ou a tecnologia moderna que elas venham a ter) seguirá tendo seu público cativo, que é este público que entra quase em um transe ao consumir falsas notícias que confirmam seus piores temores.

Trazer informação de qualidade, reprimir as fake news e proteger a saúde mental da população se mostra um trabalho hercúleo para o nosso tempo e sobre o qual estudiosos do mundo inteiro, sobretudo da União Europeia, debruçam-se há mais de dois anos, ainda sem sinais de alguma formulação de caminhos mais efetivos. Fake news é um produto. Para que exista, alguém precisa comprar. Se as pessoas passarem a ter melhores critérios de consumo e melhores produtos, deixarão de consumi-los. Como chegar a isto é o que move a todos interessados em proteger a nossa saúde mental.

E quanto a você… O que você busca quando consome informação? É informação real ou dar mais corpo a suas teses ou às teses de quem você admira? Que crítica você tem quando lê, assiste a um vídeo ou escuta uma suposta notícia? Será que você também virou o sonho de consumo dos criadores de fake news e deep fakes?

Abaixo, alguns vídeos do YouTube sobre Deepfakes:

https://www.youtube.com/watch?v=uSSTPSWg8Jk

https://www.youtube.com/watch?v=X3tU01FDPhA

https://www.youtube.com/watch?v=oxXpB9pSETo

https://www.youtube.com/watch?v=VDqTIThdj1s

https://www.youtube.com/watch?v=S0Tfu27Bz2w

https://www.youtube.com/watch?v=j_oiS1ioqRo

https://www.youtube.com/watch?v=05id0De25C4

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