Retorno ao Trabalho Presencial. Questionamentos e Estratégias para Gestores



Você está ansioso pela retomada do trabalho presencial? Está se sentindo cansado de se sentir sozinho, de sucessivas calls e de ter de trabalhar de casa? Ou você está preferindo trabalhar de forma remota e se sente desconfortável com a ideia de retornar à empresa?

Para algumas pessoas, o retorno às rotinas e conviver com os colegas pode ser muito benéfico. Para outras pessoas, no entanto, há muito mais satisfação e conforto no trabalho online e não desejam abrir mão desta modalidade. Alguns relatam, ainda, o desejo de experimentar o trabalho híbrido: alguns dias em casa, outros na empresa. 

Como gestor de pessoas você pode se sentir particularmente confuso e perdido sobre como agir no retorno de sua equipe e mesmo sobre o quê exigir da equipe no retorno.

Existem algumas coisas importantes que você pode fazer:

1) Descubra como as pessoas estão se sentindo.

Pergunte, converse, indague. Tente entender receios e motivações. Promova pesquisas anônimas para quem desejar não se identificar, mesmo achando que todos se comunicam muito bem. As pessoas nem sempre conseguem se abrir pelo medo de parecerem fracas ou não corresponderem às expectativas.

Além disso, ajude sua equipe a entender o que está sendo feito pela empresa para tornar o retorno seguro com base na ciência. Assimile a realidade de que há funcionários que preferem trabalhar de casa porque, com a pandemia, descobriram que são capazes de render mais e se concentrar melhor sem interrupções. Mesmo sem verbalizar, nem todos desejam voltar e esta é uma realidade com a qual as empresas terão de lidar.


2) Permita que as pessoas expressem a ambivalência sobre o retorno.

Quando as pessoas compartilharem suas preocupações - aberta ou anonimamente - certifique-se de naturalizar que elas possuem sentimentos mistos e complexos. É tentador você querer ser positivo (ou impositivo?) sobre as mudanças que estão por vir como uma forma de amenizar as preocupações, mas você corre o risco de fazer as pessoas se sentirem rejeitadas ou pode, inadvertidamente, pressioná-las a esconder seus sentimentos negativos em relação ao retorno.


3) Naturalize sentimentos contraditórios. Apoie. Encoraje. 

É muito pouco provável que uma pessoa se sinta absolutamente emocionada ou completamente desanimada, então incentive as pessoas a expressarem emoções positivas e negativas. Somos um misto de sentimentos, sobretudo quando o assunto é “pandemia”. Não force uma resolução ordenada para esses sentimentos. Mesmo em quem deseja voltar ao trabalho presencial existem receios. Medo de contaminação, medo de se expor desnecessariamente, medo de conviver com colegas que não atentam para medidas de segurança e coloquem todos em risco, por exemplo.

Por outro lado, quem deseja trabalhar de casa pode ter o receio de ser discriminado por sua preferência, como se isto significasse “não vestir a camisa da empresa”, o que de forma alguma pode ser naturalizado. Não é por que um colaborador deseja seguir trabalhando de casa que ele será menos dedicado. Não torne rasas reflexões que devem ser profundas.

As pessoas anseiam por coisas diferentes neste momento, o que não pode ser interpretado como resistência. Medos ancestrais estão presentes. Desejo por segurança convive com uma maior ou menor necessidade de socialização dependendo da pessoa envolvida. Desejo por ter seu trabalho reconhecido e por ter um líder atento ao seu desempenho convivem com o receio de não ser promovido por preferir trabalhar de forma remota e assim por diante.

Os líderes que modelam a ambivalência podem criar uma cultura em que as pessoas se adaptam e se articulam com mais facilidade.

4) Ofereça flexibilidade, se possível.

Se possível, pelo menos no início da reabertura do seu escritório, dê às pessoas algumas opções sobre quando e com que frequência elas podem retornar. Como refere Dutton em pesquisa realizada pela Universidade de  Harvard sobre o retorno ao trabalho pós-pandemia: “A mensagem deve ser de flexibilidade, flexibilidade, flexibilidade”, especialmente levando em consideração o que todos já passaram no ano passado. “Tem havido muitas fontes de dor, não apenas a pandemia, mas também a luta em torno da justiça racial e da política”, diz ela. “Não podemos presumir que sabemos o quão traumatizante é para as pessoas.”


Ser flexível não é apenas ser gentil e compassivo; trata-se também de manter a produtividade e reter pessoas. “O contrato psicológico com as pessoas é frágil agora”, diz Dutton, “Se você for muito forte, corre o risco de quebrar esse contrato e o envolvimento pode despencar”. 


A pesquisa aponta que 58% das pessoas dizem que "absolutamente procurariam um novo emprego se não fossem autorizados a continuar trabalhando remotamente em sua posição atual". Dos mais de 2.000 entrevistados, 65% queriam trabalhar remotamente em tempo integral após a pandemia, e outros 33% preferem um acordo de trabalho híbrido.

“Você não conseguirá o que deseja se basicamente arrastar pessoas para o escritório”, diz Hirsh, outro estudioso do assunto. “A pressa para estabelecer o velho normal não faz sentido e vai causar atrito.” A perda de segurança psicológica resultante e o aumento do estresse afetarão a produtividade e a camaradagem da equipe - o que provavelmente é uma das motivações para fazer as pessoas voltarem.

5) Como gestor, caberá a você explicar os “porquês” da empresa, mas não minimize os porquês dos colaboradores

Quando as pessoas precisam fazer algo que os deixa ansiosos, pode ajudar saber que há um bom motivo para isso. Se os líderes seniores em sua empresa não articularam claramente por que consideram importante que as pessoas voltem para o escritório, pode ser fundamental lidar com essa lacuna. Você provavelmente poderá ser lançado a uma posição de mediador entre interesses opostos. A empresa deve ser instada a se questionar: “Qual é a proposta de valor que estamos agregando para os colaboradores voltarem?” “O que o retorno físico acrescenta, de fato, aos colaboradores- e não apenas à empresa?”.

Isso poderá diminuir os conflitos entre a vida profissional e a profissional, se houver.

6) Considere experimentos e programas-piloto.

Algumas pessoas podem hesitar porque simplesmente não sabem o que esperar ou como se sentirão. E uma transição de volta para cinco dias por semana no escritório pode parecer repentina, como ligar um interruptor de luz. Para evitar sobrecarregar os colaboradores e ajudá-los a adotar uma maneira diferente de trabalhar, considere a possibilidade de executar programas-piloto ou permitir que as pessoas experimentem individualmente.  Passos de bebê são uma boa ideia, especialmente para quem tem preocupações. A mensagem pode ser: “Vamos experimentar e ver o que aprendemos”. Em seguida, certifique-se de pedir feedback ao longo do caminho para que você possa entender o que está funcionando e o que não está.

Essa abordagem pode ser usada individualmente também para colaboradores particularmente ansiosos. Você pode sugerir que eles tentem ir um dia por semana durante várias semanas e, em seguida, você pode verificar como foi e solucionar os problemas que eles ainda têm.

7) Não faça promessas que você não pode cumprir.

Da mesma forma, não diga às pessoas de sua equipe que você poderá fazer adaptações sem antes confirmar com os líderes seniores e com o RH. Como todos nós aprendemos no ano passado, as circunstâncias provavelmente vão evoluir e, embora possa ser normal alguém escolher trabalhar em casa agora, isso pode mudar mais tarde.

Na tentativa de reter funcionários importantes, você pode ficar tentado a garantir que eles possam trabalhar em casa pelo tempo que quiserem, mas isso simplesmente pode não ser verdade. Portanto, seja realista e direto com sua equipe.

8) Tenha compaixão.

Não importa quais mensagens você tem que entregar, quais acomodações você pode e não pode fazer, e quais políticas você pode ter que aplicar, faça tudo com compaixão. Muitas vezes é um antídoto para a ansiedade. Dutton aponta para uma pesquisa feita em ambientes de saúde que mostrou que uma interação compassiva entre um médico e um paciente com duração de apenas 40 segundos teve um efeito mensurável na ansiedade do paciente e nos resultados de saúde.

“Encontre pequenas maneiras de estar presente para seu pessoal”, diz ela. Continue perguntando sobre como eles estão e o que mais está acontecendo além do trabalho. Fale sobre o que você está passando para que eles façam o mesmo. Fique atento a sinais de esgotamento e estresse, especialmente quando o horário de trabalho muda.


9) Tenha compaixão também com você, não apenas com sua equipe.


Vamos ser honestos: a maioria dos bons gerentes tem feito isso desde o início da pandemia e provavelmente estão exaustos da responsabilidade adicional de cuidar do bem-estar dos membros da equipe durante um período tão intenso. “A fadiga da compaixão é real”, diz Dutton. É por isso que é fundamental que você cuide de si mesmo - não apenas dos membros da sua equipe.

Observe os sintomas de esgotamento e faça pausas para a saúde mental quando precisar. Uma vantagem desse aspecto tão envolvente do seu trabalho é que a pesquisa mostrou que ser compassivo também "eleva o doador", ou seja, mesmo que seja uma dedicação exaustiva, você também pode ser fortalecido por esta forma doadora de gestão de pessoas.

Um dos poucos aspectos positivos da pandemia é que se tornou mais aceitável falar sobre saúde mental, inclusive no trabalho. Só porque muitos de nós estarão retornando para o escritório não significa que a conversa e a compaixão em torno deste assunto devem parar. Ao contrário. Aproveite e mantenha o assunto em voga. Sempre houve esta necessidade, só que antes ela era negada.

Nenhuma vacina vai acabar com a dor e com o trauma que todos nós vivemos. Nenhum retorno a uma situação supostamente conhecida vai tornar menos assustadora a ansiedade de conviver com o imponderável. Não banalize sentimentos, não busque respostas mágicas. O retorno deve ser assimilado como um processo com suas resistências, com seus altos e baixos.

10) Dê voz a quem se sente com medo, ansioso, sufocado, perdido. Boa parte das vezes esta pessoa poderá ser você.

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